Jogos mentais
Psicólogos do esporte levam seus conselhos às ruas e ajudam atletas a não perder o foco
Por Nancy Averett
Kate Hays, doutora em psicologia do esporte e psicóloga da Maratona de Toronto (Canadá), já teve contato com todo tipo de ansiedade pré-corrida. Ela conta que uma vez, minutos antes da prova, um homem chegou a questionar se deveria mesmo correr usando um chapéu de chef de cozinha, além de carregar um bolo para anunciar seu restaurante, mesmo tendo treinado bastante a "ação de marketing" nos dias anteriores à prova. Kate sabia que recitar um mantra sempre ajuda, e lançou um para o paciente: "Você já sabe que consegue correr 30 km", disse ela. "O resto é fácil."
Parece bobo, mas vozes reconfortantes como a de Kate disponíveis aos corredores são cada vez mais comuns em maratonas. Os diretores das provas já reconhecem a importância de ter à mão alguém que entende os desafios mentais encarados pelos corredores. Tanto no aquecimento quanto na linha de partida, psicólogos do esporte, que normalmente também são corredores, ensinam aos atletas truques mentais para superar o nervosismo pré-prova. Durante a corrida, alguns passeiam de bicicleta ao longo do percurso, dando apoio aos que passam por dificuldades. Depois, esses profissionais ainda trabalham nas tendas, cuidando de egos feridos.
Você pode aprender com a experiência desses doutores da corrida, esteja treinando para uma maratona, esteja simplesmente buscando aumentar a quilometragem semanal. Veja as dicas.
Cabeça boa
Os macetes dos corredores de elite para seguir em frente
"Eu conto quantos passos dou entre os quadrados do piso da calçada, tentando não pisar nas linhas divisórias. Às vezes transformo em um jogo: encaixo a maior quantidade possível de passos em um quadrado e, no outro, tento dar uma quantidade mínima de passos. Ou então criar um padrão: dois passos em um trecho, três no outro, dois, três, dois etc. Isso evita que eu fique pensando em como preferiria estar fazendo outra coisa em vez de correr." Desiree Davila – 13º lugar nas seletivas americanas da maratona feminina para a Olimpíada de Pequim, em 2008
Conheça o terreno
A doutora em psicologia Suzanne McAllister Avery, que já fez parte da equipe de psicoterapeutas da Maratona de Nova York, recomenda que os atletas façam um reconhecimento de terreno e dos pontos de referência dos percursos de prova e treino. Assim você saberá, por exemplo, que precisa guardar energia para aquela subida perto do km 13. Ou poderá respirar mais tranquilo quando passar por um monumento, sabendo que só falta 1 km para a chegada.
Carregue um talismã
"Pode ser motivador olhar para um pequeno objeto que o faça lembrar por que está correndo", diz Kate Hays. A psicóloga conhece uma mulher que dedicou uma maratona aos pais já falecidos, depois de ter usado os anéis de casamento deles no dia da prova. A japonesa Mizuki Noguchi correu a maratona nos Jogos Olímpicos de Atenas, em 2004, com um omamori, amuleto com as bênçãos de um monge xintoísta, que fica dentro de uma trouxinha bordada, costurado nos shorts. Conquistou a medalha de ouro.
Solte-se
Austin "Ozzie" Gontang, psicoterapeuta e maratonista, costuma pedalar até os marcadores dos km 5, 22 e 38 da Maratona Rock 'n' Roll de San Diego (EUA). Com um megafone, passa suas dicas aos atletas: "Relaxe o maxilar... Relaxe os ombros... Corra de cabeça erguida... Mais suave... Deixe fluir". Gontang encoraja os corredores a repetir essa lista para si mesmos. “Ajuda a relaxar e, assim, a correr mais facilidade”, afirma.
Use imagens
Jack Bowman, psicólogo do esporte que dirigiu por 12 anos a equipe de psicoterapeutas da Maratona de Long Island (EUA), garante que visualizar imagens pode ajudar a estabilizar o ritmo. A técnica favorita dele é imaginar que a parte inferior de seu corpo é um cavalo forte e musculoso sobre o qual a parte superior do corpo cavalga. “Ao se concentrar nessa imagem, você sente que não faz esforço para correr”, afirma. Outro truque recomendado por Bowman vem de Frank Shorter, medalha de ouro na maratona nos Jogos de Munique, em 1972: ele visualizava suas pernas como se fossem rodas de bicicleta deslizando suavemente pela rua.
Tenha metas realistas
Se o desempenho em uma prova fica abaixo do esperado, muitos atletas se mostram arrasados. Para evitar esse trauma, Kate Hays aconselha ter três objetivos: o primeiro é o objetivo "excelente" – que é o tempo que você obteria numa corrida após uma bela noite de sono, com as pernas descansadas e a ajuda do seu estômago e do clima. O segundo é o “bom”, com o qual você se contentaria. E o último é o "ok, eu posso conviver com isso", para aquelas corridas em que o calor está insuportável, ou o jantar da noite anterior está revirando seu estômago. Não revele aos outros seu primeiro objetivo. Se chegar lá, poderá se orgulhar. Senão, ninguém ficará sabendo.
Pense positivo
Bowman aconselha que os corredores armazenem boas memórias de corridas para usar mais tarde. "Lembre-se dos momentos de sucesso, talvez a primeira vez que você chegou ao topo de uma subida íngreme sem parar, e como isso o fez sentir-se poderoso", diz. "Invoque esses pensamentos sempre que precisar de ânimo." Kate cita o caso de um corredor que levava consigo cartões com mantras, piadas e recordações da família e dos amigos. "Quando você está lá, correndo, precisa ser sua própria torcida", afirma ela. "Qualquer energia positiva será uma bela ajuda para seguir até o fim."
Sinta-se melhor
Experimente diferentes estratégias mentais durante os treinos e encontre as que funcionam para você. E use-as no dia da prova.
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